quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Fogão de lenha

Era sagrado.
Todos os dias eu acordava, ia pra escola, almoçava e pegava as minhas panelinhas: era hora de fazer comida.
Saía pelo quintal recolhendo plantinhas diversas, terra, pedrinhas, gravetos e água. Eu desenformava bolinhos lindos de terra, decorava com folhas e servia para minhas bonecas no jogo de pratos rosa que minha mãe tinha comprado pra mim.
Eu poderia fazer isso na varanda da casa, na garagem, mas nada como cozinhar no quintal.
Lembro que minha mãe me procurava muitas vezes pela casa e me encontrava no meio do quintal, falando sozinha e cavando o chão em busca de terra mais fofa.
Eu passava horas ali.
Aí eu cresci e descobri que cozinhar comidas de verdade era também prazeroso, e descobri que tenho um certo talento pra coisa... Em meio a tantos almoços que precisei fazer, as lembranças dos tempos de fazer comidinhas de terra fora de casa foram ficando guardadas em algum canto aqui dentro.
Até essa semana.
Minha mãe instalou um fogão de lenha no quintal, colocou uma mesa perto, comprou um jogo de panelas de ferro, colheres de pau e ingredientes naturais. Chegou com as sacolas do mercado toda feliz e disse:
- Me ajuda a cozinhar no quintal?
Eu pude sentir o cheiro da terra molhada.
Cortamos os temperos na mesa, sentindo o vento bater no rosto, cuidando do fogo, colocando mais lenha, mexendo nas panelas. Cena que vai ficar pra sempre na memória.
Voltamos a ser criança.
Perguntei:
- Mãe, a senhora cozinhava no quintal quando era criança?
Ela respondeu:
- Sim, como você fazia.
E ficamos ali, por quase três horas, curtindo a magia de voltar a ser criança quando adulto.
Melhor que isso foi abrir as panelas e poder comer o que havíamos feito. Estava delicioso... A comida e as lembranças.

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