Minha mãe sempre gostou de História. Cresci ouvindo as
histórias da ditadura, do Collor, e de algumas personalidades que não me vem à
memória agora porque eu não tenho memória boa.
Esses dias eu tirei uma nota ruim numa disciplina que
trata exatamente de política.
Eu nunca gostei de política.
É meio piegas falar
isso, mas é verdade. Sempre evitei ler as histórias e os acontecimentos por
dois motivos:
Primeiro: eu sei que, depois de saber em detalhes os
funarés que esses engravatados vêm causando desde que o Brasil é Brasil, eu sei
que passarei semanas tomando doses redobradas de ansiodoron e ficarei parecendo
uma velha chata reclamando de tudo com todos.
Segundo: eu sou
péssima em entender a linha do tempo das histórias. Qualquer história que
alguém me conte eu irei confundir com alguma outra que ouvi ou então trocarei
os acontecimentos passados pelos mais recentes e vice-versa.
Definitivamente, não é uma boa ideia.
Eu que não sei contar a ordem cronológica dos
acontecimentos na minha vida, vou saber contar alguma história que aconteceu em
20, 30, 50 anos no Brasil?
Mas como nem tudo são flores, uma hora a gente acaba
batendo de testa com aquilo que a gente não gosta e eu bati de testa com a
política e tudo o que envolve a política e me dei mal.
Eu li horrores, estudei, li os capítulos do livro,
pesquisei, estudei as anotações do meu caderno. Fiquei vesga – literalmente –
de tanto ler.
Mas parece que não foi suficiente, minha colega de classe que só leu o resumo no ônibus enquanto ia pra faculdade tirou 10,0.
Mas parece que não foi suficiente, minha colega de classe que só leu o resumo no ônibus enquanto ia pra faculdade tirou 10,0.
Você sabe, eu fiquei péssima.
Quando recebi a prova eu tive vontade de me bater, de me
perguntar o que eu realmente estou pensando da vida e fazer um daqueles discursos
que a minha mãe costumava me fazer quando eu estava na quinta série.
Eu percebi também que algumas pessoas que pegaram a mesma
prova que eu, já que a prova era sortida, também não tiraram boas notas. Então,
para justificar essa nota ruim pra minha mãe – sim, ela ainda monitora minhas
notas na faculdade como se eu ainda estivesse no primeiro ano - , eu disse pra
minha mãe que a prova que eu peguei estava extremamente difícil, que ninguém
que pegou a mesma prova que eu tirou mais que 8,0.
Ela semicerrou os olhos, me olhou e disse:
“Você devia ter estudado.”
Eu fiquei 50 tons de bege e repliquei:
“Mas, mãe... A senhora viu que eu estudei! Estava
realmente difícil.”
Ela voltou a escrever no seu caderno e resmungou:
“Você poderia ter estudado mais.”
Eu me senti de novo no segundo ano, criticada pela minha
mãe por ter tirado 9,0 em português porque eu errei acentuação das palavras.
Ela havia me ensinado as palavras desde os meus três anos de idade, jamais iria aceitar que eu errasse a acentuação da palavra “coração” e “atenção”.
Ela havia me ensinado as palavras desde os meus três anos de idade, jamais iria aceitar que eu errasse a acentuação da palavra “coração” e “atenção”.
Hoje, todas as vezes que escrevo “coração” lembro do
cheirinho da minha mãe e da letra dela que mais parece uma obra de arte me
ensinando o cedilha e o til.
E agora, pra sempre me lembrarei do olhar semicerrado
dela me dizendo que eu poderia ter estudado mais. Eu poderia ter lido mais, ter
me interessado mais.
Eu sei que jamais ouvirei de minha mãe:
“Já tá bom de estudar.”
Lembro como se fosse hoje, numa caminhada na beira-mar, enquanto o sol se escondia por detrás das montanhas, ela me olhou carente e disse pra eu nunca parar de estudar, pra eu nunca deixar de amar seja lá o que
for.
Eu poderia ter tirado a nota que ela queria tirar por
mim.